A Lei nº 14.879/2024, sancionada pelo Governo Federal em 4 de junho de 2024, trouxe mudanças importantes para o Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), impactando diretamente a forma como as partes podem eleger o foro para a resolução de disputas em contratos comerciais. As alterações visam combater práticas abusivas que dificultavam o acesso à justiça, promovendo maior equilíbrio e transparência nas relações jurídicas entre partes contratantes, especialmente quando uma delas está em desvantagem negocial. Neste post, vamos explorar detalhadamente as inovações trazidas pela nova legislação, o impacto para as empresas e consumidores, e o papel dessa lei no fortalecimento da segurança jurídica nas relações comerciais.
Antes da sanção da Lei 14.879/2024, o Código de Processo Civil permitia que as partes escolhessem livremente o foro onde eventuais disputas relacionadas ao contrato seriam resolvidas. Bastava que a eleição do foro fosse expressamente mencionada em um instrumento escrito que fizesse referência ao contrato em questão. Essa liberdade, no entanto, abriu caminho para práticas abusivas, especialmente em situações onde uma das partes, geralmente a mais forte comercialmente, impunha um foro distante ou desconectado das partes envolvidas ou da natureza do contrato.
Essa escolha, em muitos casos, dificultava o acesso da parte em desvantagem ao Poder Judiciário, seja por questões geográficas ou de custo, criando uma barreira de acesso à justiça. A nova legislação visa corrigir esse desequilíbrio, impondo regras mais rígidas para a eleição de foro.
A Lei 14.879/2024 trouxe duas mudanças principais no artigo 63 do Código de Processo Civil:
1. Vinculação do foro eleito ao domicílio ou local da obrigação: Com as novas regras, a eleição de foro só terá validade se estiver vinculada ao domicílio ou à residência de uma das partes ou ao local de execução da obrigação contratual. Essa exigência de pertinência evita que um foro aleatório, sem conexão com o contrato ou com as partes envolvidas, seja utilizado para dificultar o acesso à justiça.
2. Declínio de competência de ofício: Caso a ação seja ajuizada em um foro aleatório, o juiz poderá, de ofício (ou seja, sem a necessidade de provocação das partes), declinar a competência para o foro adequado. Isso significa que a própria autoridade judicial poderá, ao identificar uma escolha abusiva de foro, determinar que o caso seja transferido para o foro correto, respeitando os critérios estabelecidos pela nova lei.
Uma das principais inovações da Lei 14.879/2024 é a caracterização da eleição de foro aleatório como uma prática abusiva. Em contratos onde uma das partes tem maior poder de negociação, especialmente em contratos de adesão ou envolvendo pequenas empresas, a imposição de um foro distante ou inconveniente tem sido usada como uma estratégia para afastar a outra parte da disputa judicial. Com a nova legislação, esse tipo de prática passa a ser formalmente rechaçada pelo ordenamento jurídico.
Ao impor critérios claros para a eleição de foro, a lei não só combate a prática de imposição de foros desvantajosos como também fortalece a posição das partes mais vulneráveis nas negociações. Isso representa um avanço importante para a promoção da equidade nas relações comerciais e jurídicas.
Outro aspecto relevante da Lei 14.879/2024 é o tratamento dado aos contratos de consumo. Mesmo que o foro eleito não atenda às novas exigências, ele poderá ser considerado válido desde que beneficie o consumidor. Isso reforça a proteção aos direitos do consumidor, já assegurada pelo Código de Defesa do Consumidor, e alerta as empresas sobre a necessidade de revisar suas práticas contratuais. A partir de agora, as empresas devem estar atentas para garantir que suas cláusulas de eleição de foro não sejam vistas como uma tentativa de desvirtuar os direitos dos consumidores.
Esse ponto é crucial, pois as empresas que buscam manter sua reputação no mercado devem garantir que suas práticas contratuais sejam transparentes e justas. A adoção de cláusulas abusivas não apenas pode resultar em litígios, mas também pode prejudicar a confiança do consumidor e afetar a imagem da empresa no mercado.
A Lei 14.879/2024 representa uma mudança significativa na forma como as disputas contratuais serão tratadas no Brasil, trazendo benefícios tanto para as empresas quanto para os consumidores. Ao promover maior transparência e limitar a possibilidade de abusos na escolha do foro, a lei ajuda a equilibrar as relações comerciais, protegendo especialmente as partes em desvantagem negocial.
Para as empresas, as mudanças exigem uma revisão cuidadosa de seus contratos, especialmente os contratos de adesão, para garantir que as cláusulas de eleição de foro estejam em conformidade com a nova legislação. Essa revisão pode prevenir disputas judiciais e garantir maior segurança jurídica nas operações comerciais.
Por outro lado, para os consumidores e pequenas empresas, a nova lei oferece uma proteção adicional, evitando que cláusulas de eleição de foro sejam usadas como uma barreira ao acesso à justiça. Isso fortalece o papel do Judiciário na garantia de equidade nas relações comerciais, promovendo um ambiente mais justo e transparente para a resolução de conflitos.
A Lei 14.879/2024 representa um marco importante para o direito processual brasileiro, ao estabelecer novas regras para a eleição de foro e combater práticas abusivas que vinham sendo usadas para dificultar o acesso à justiça. Ao exigir que o foro eleito tenha uma conexão com as partes ou com o local da obrigação, a legislação promove maior equilíbrio nas relações comerciais, protegendo as partes mais vulneráveis e reforçando a transparência nos contratos.
Empresas e profissionais do direito devem estar atentos às implicações práticas dessa nova legislação, revisando contratos e adequando suas práticas comerciais para garantir conformidade com as novas regras. Por outro lado, consumidores e pequenas empresas se beneficiam diretamente dessas mudanças, com maior proteção contra cláusulas contratuais abusivas.
Assim, a Lei 14.879/2024 contribui para um ambiente jurídico mais justo, onde todas as partes têm seu direito de acesso à justiça assegurado, sem barreiras artificiais criadas por práticas abusivas. A nova legislação é, portanto, um passo significativo para a promoção da equidade nas relações comerciais e para o fortalecimento da segurança jurídica no Brasil.